sábado, janeiro 10, 2015

A ausência da coerencia de todos nós

Todo este tema dos ataques em Paris tiveram um impacto um pouco maior do que o costume em mim. Como escrevi por ser 1/3 francês e por achar que a França, com a sua maior comunidade muçulmana na Europa, a sua diversidade e sociedade multi-cultural, e enfrentado já problemas étnicos desde há alguns anos, seria o exemplo do futuro da Europa depois de encontrar o equilíbrio semi-perfeito.

Não sei se algum dia chegarei a dissertar sobre isto, pois vários pensamentos já me passaram pela cabeça, já escrevi várias coisas do momento, seja aqui, no Facebook, em comentários a outros blogs e pelo Twitter que se tornou o principal meio de partilhar pensamentos e notícias.

No entanto quero apenas dissertar rapidamente sobre os comentários que tem surgido por todo o lado, e até o que eu tenho constatado e pensado por mim, pois sou por vezes tão incoerente como os outros.

A Carolina ontem disse-me que estava a seguir pela CNN e que era uma maluqueira porque eles só falavam que nos EUA nunca aconteceria isto porque os gajos já eram conhecidos dos serviços de vigilância, enfim o paleio do costume. Parece que os americanos se esqueceram dos irmãos Tsarnaev que fizeram o ataque da maratona de Boston. É certo que esses irmãos era muito mais low profile, mas estavam também referenciados, pelo menos o mais velho, nos serviços de vigilância.

Uma das coisas que mim me chocou é que 2 dos 3 supostos terroristas (terroristas porque espalharam o terror e não por serem necessariamente afiliados de organizações ditas terroristas) já terem estado presos precisamente por ligações a conhecidos, e condenados, terroristas. Li escrito no Le Figaro que o Amedy Coulibaly, de origem mali, que já tinha estado preso e tentou fugir em 2010, foi condenado em 2013 a 5 anos de cadeia. Curiosamente pouco mais de 1 ano e estava cá fora a matar pessoas. Bonito né? E as pessoas perguntam-se, incluindo eu, como é possível isto? Mas por outro lado, muitas outras vezes, às vezes as mesmas pessoas de agora, queixam-se que se vive num estado repressivo e policial e se prende demasiadas pessoas. Portanto Amedy Coulibaly estar cá fora e ter acesso a armas e continuar em contacto com outros malucos como ele, é normal e apenas o reflexo duma sociedade que acha que não se deve punir. Mas depois a mesma queixa-se que se pune pouco, quando as coisas correm para o torto. Tipo como o caso do juiz que mete um assaltante de carros 4 dias consecutivos cá fora apenas com termo de identidade e residência até que o mesmo assaltante, ironia do destino ou justiça celestial, rouba o carro do próprio juiz à saída do próprio tribunal (aconteceu em Aveiro)!

Temos também o caso das pessoas acharem que existe muita pressão sobre os media, e falta de verdadeira liberdade de expressão pois alguém que fale contra o poder estabelecido arrisca-se a perder o emprego ou a ser alvo de investigações e ameaças, mas depois quando 2 palermas levam essas ameaças por diante, muitas das mesmas pessoas já acham que tem de se ter cuidado no que se diz e que não se pode ofender certas entidades ou grupos.
Ao mesmo tempo que se pede liberdade diversas vezes ao longo do ano, estamos dispostos a abdicar de parte dela e ficar caladinhos e quietinhos em relação a certos temas dito polémicos, com medo de sofrer represálias. É esta a verdadeira vitória do terrorismo; basta nos impor o medo e com ele conseguir vergar as pessoas de bem.

E o reverso da medalha de todos estes ataques é que volta novamente a ganhar força as ideias que tudo tem de ser escrutinado e controlado. Falo mais especificamente nas comunicações, incluindo a Internet, e até mesmo da vida privada das pessoas. Já existe um abuso na monitorização das vidas privadas de certas pessoas, e muitos de nós sabemos disso e falamos sobre e contra isso, mas agora, como houve merda, lá vêm os "vira-casacas", que só andam ao sabor da maré, dizer que é preciso controlar, vigiar e escrutinar ainda mais.
Mas os mesmos que agora dizem isso, estarão daqui a uns meses a brandir aos céus a sua revolta por terem de demorar ainda mais tempo a passar a segurança nos aeroportos, que o Google e o Facebook controlam tudo e sabem tudo, e que os Governos estão a ser cada vez mais um Big Brother e ninguém é realmente livre...

Termino com o pensamento que me surgiu logo que li os primeiros relatos que os assassinos gritaram Allāhu Akbar quando atacaram a redacção do Charlie Hebdo.
É conveniente e simples que os atacantes sejam extremistas islâmicos. Da mesma forma que é natural em muitas cidades que um vulgar assaltante seja um negro. Mas o que pensei mesmo é que iriam surgir em pouco tempo as típicas teorias da conspiração que estes actos, tal como os 2 voos da Malaysia Airlines, tal como a Al-Qaeda e o Estado Islâmico (ISIS), tal como o conflito na Ucrânia, são obra dos Americanos e Judeus (Israel). No caso da Al-Qaeda e do ISIS é verdade até certo ponto. Mas continuando, já era de esperar essas teorias. E na realidade têm pontos válidos, como o conveniente que foi um dos irmãos ter deixado o seu cartão de identidade no carro, eles terem sido cordiais com as pessoas que assaltaram e terem deixado instruções claras para dizerem aos media que eram da Al-Qaeda do Yemen, e como os 3 entraram em contacto com a BFM para repetirem a mesma mensagem, apesar do gajo na Porte de Vincennes dizer que era do Estado Islâmico. E depois são os 3 mortos para que não haja azo a negações e contradições durante o interrogatório (e mais tarde julgamento).
É tudo verdade e verosímil, mas não podemos deixar de notar que num caso como este as autoridades conseguem encontrar muitos indícios e existem várias testemunhas e vitimas que deram declarações. Todas estas pessoas tiveram de ser compradas e se o golpe é dos Americanos, temos de ter franceses e muitos deles críticos do poder, a fazer o joguinho de estrangeiros e do poder estabelecido.
Não se esqueçam que os membros do Charlie Hebdo já criticavam tudo e todos e duvido seriamente que os sobreviventes agora vão ficar calados e pactuar na maior com uma conspiração internacional.

Costuma se dizer que a explicação mais simples e que responde melhor a uma questão é, na grande maioria dos casos, a correcta. É fácil e é conveniente para muitos interesses, mas acredito por enquanto que os principais responsáveis por estes ataques foram os 3 palhaços mais os que os suportavam e influenciaram. Que há interesses maiores e obscuros por detrás de tudo isto, também não tenho dúvidas nenhumas.

O pior disto tudo foram as 17 vítimas mortais, os 12 no ataque ao Charlie Hebdo, a polícia municipal em Montrouge no dia seguinte e ontem as 4 no super-mercado kosher na Porte de Vincennes.
Paz à sua alma e que as suas mortes não sejam em vão e sejam infelizmente um passo triste na direcção correcta que é a vivência cordial e pacífica entre credos, etnias, raças e classes.
Mas até lá chegarmos vão continuar a haver mais vitimas, como continuaram durante estes dias na Nigéria, Iraque, Síria, Líbia, Ucrânia e tantos outros países onde as pessoas matam pessoas porque ainda não evoluímos o suficiente.

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