Eu queria escrever algo mais sobre as eleições daqui da próxima quarta-feira por várias razões (espero que uma delas se torne óbvia em breve) mas os acontecimentos desta noite para além de me manterem acordado precipitaram a escrita desta dissertação.
Mas a melhor forma de começar este texto é começar pelo início e esse é o título e a imagem, na verdade duas, do mesmo. É genial a campanha da Netflix para a série "House of Cards" aproveitando as eleições daqui e uma das citações mais conhecidas da personagem principal, Frank Underwood.
Na imagem da esquerda podem ver um grande outdoor onde o anúncio da série parece sobrepor-se a cartazes de campanha. Que eu saiba este foi criado de propósito para a anúncio. Mas o que se vê por aí, e eu já vi vários em Amesterdão, nos outdoors comuns onde estão os cartazes dos partidos, como eu referi na minha anterior dissertação, é que é do melhor. Alguém fez cartazes do mesmo tamanho dos dos partidos e andaram a colar por essa Holanda fora, dando a ideia que Frank Underwood é um candidato às eleições daqui!
Muito bom.
Melhor que isso mesmo é existir uma espécie de partido, ou movimento, que está mesmo a concorrer às eleições, chamado Niet Stemmers (Não Votantes), que afirma ser o maior partido político da Holanda porque nas passadas eleições houve 25% de não-votantes! A promessa deles é que se tiverem deputados eleitos, esses deputados não vão votar em nada! Acho que é uma ideia engraçada para convencer a malta que se abstêm e arranjar um tacho a fazer mesmo nada.
Mas como disse os eventos desta noite tiveram um impacto. E esses eventos é a "guerra diplomática" entre os Países Baixos e a Turquia que resultou nesta noite em manifestações em Roterdão, a polícia a fazer um cordão de segurança em redor do mesmo cortando o seu acesso, e o impedirem a Ministra da Família turca, que veio de carro mais a sua comitiva da Alemanha, de entrar no consulado e escoltarem-na de volta para a Alemanha, depois dela ter sido declarada persona non-grata.
Assim de repente isto pareceu cair do nada, mas tem a ver com o referendo do Erdogan, que eu já mencionei aqui, e o facto dos ministros turcos andarem a fazer campanha política pelos países europeus com grande comunidade turca. Já deu problemas na Alemanha, agora foi na Holanda e a Suiça e Turquia também já disseram que vão cancelar os comícios. Isto tudo porque estes países afirmam que os ministros turcos não podem vir fazer campanha nem comícios políticos aqui. Se isto é mesmo assim ou não tenho de ver melhor, em matéria de direito internacional.
Mas a verdade é que esta situação traz novo fôlego ao PVV e ao seu líder Gerd Wilders. Já li analistas, e não só, escreverem que isto vai resultar em mais votos (resta saber quantos) para o PVV, pois as pessoas vêm como a Turquia e os turcos reagem e irão por ventura se virar para o político que afirma que irá combater esses malvados e pôr-los na ordem.
O Erdogan disse que a Holanda é remanescentes de Nazis e fascistas. Como escrevi no Twitter eu estou convencido que no geral não é mas estes actos ajudam a que os fascistas ganhem mais apoio.
E agora estou novamente dividido. Antes estava seguro que o PVV seria o partido mais votado. Durante esta semana fiquei convencido que não, até porque as pessoas voltam mais ao normal, e o VVD é a normalidade, quando não há polémica nenhuma. Mas agora surge esta polémica.
E o PVV adora polémicas deste género, porque é com elas que ele prospera.
Posso dar o exemplo do Zwarte Piet, do qual já escrevi antes. Desde que aqui estou que todos os anos por alturas do São Nicolau surge a polémica do Zwarte Piet. E muitos holandeses, mais nacionalistas e tradicionalistas ficam super-ofendidos por haver outras pessoas, nomeadamente de outras etnias e origens, que acham que é ofensivo e até mesmo racista.
Como é uma tradição querida por muitos, as mudanças que muita gente tem pedido e até tem sido levadas a cabo (em Amesterdão o Piet já não se pinta de preto e só está mesmo sujo de fuligem, a suposta versão oficial dele parecer preto mas em muitas escolas ou creches os Piet são agora de várias cores) não são bem aceites. O Wilders clama que vai proteger o Zwaarte Piet, ou seja promete manter uma figura com conotações claramente racistas e que ofende uma larga percentagem, mesmo que não a maioria, da população. E é por isso que todos os anos o PVV beneficia desta discussão.
Basta ver que o PVV subiu nas sondagens por essa altura.
É aquilo que eu chamo, se calhar outros também já o chamaram, de "Efeito Zwaarte Piet".
Isto também ajuda a explicar porque é que passado umas semanas da época natalícia, quando toda a gente já se esqueceu do Piet, menos pessoas tencionam votar no PVV. Porque as preocupações são outras.
Mas a cada polémica na sociedade holandesa que envolva os cavalos de batalha do Wilders, resulta no Efeito Zwarte Piet. Se algo de mau e polémico está a acontecer e os marroquinos ou muçulmanos estão metidos ao barulho, é garantido que as pessoas vão pensar que vale a pena votar no PVV pois só eles vão resolver este tipo de problemas.
De certa forma isto é uma explicação simples de porque é que num país tido tão tolerante um partido da extrema-direita possa ser o mais votado numas eleições gerais.
Mais que dizer que os holandeses têm pouca ou má educação, são racistas e xenófobos, os holandeses são sobretudo muito orgulhosos no que é típico deles. E na realidade muitos, sobretudo os mais velhos pois os mais novos já nasceram numa sociedade que é agora global, preferem um regresso a tempos mais simples e, falando curto e grosso, tempos mais brancos e cristãos.
Eu tenho ainda uma outra explicação, ou teoria, de porque é que estamos a assistir agora a este aparente retrocesso da sociedade em muitos países ocidentais, mas essa é outra dissertação.
Já agora completo o círculo e volto ao início. Apesar de reconhecer as referências eu pessoalmente não sou estou muito por dentro da House of Cards. Comecei a ver a primeira temporada mas parei de ver no episódio 8. Não estava realmente a ligar-me com a série o que me deixou bastante surpreendido tendo em conta o tema e o quão bem cotada e apreciada a série é.
Enfim, não se pode gostar de tudo o que é bom...
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