domingo, maio 05, 2019

Como a chacina dos nativo-americanos pelos europeus mudou o clima


Antes de mais tenho de avisar que tive dificuldades em arranjar um título para esta dissertação. Isto porque o que acabei por escolher é uma tradução, à minha maneira, do título da página da CNN com esta notícia/artigo/peça, aquele que se vê no topo do browser, mas o título que aparece depois é ligeiramente mais comprido e usa uma terminologia um pouco diferente. Mas sobretudo porque uso esta frase chave mas não é essa a minha mensagem, como vão descobrir quando acabarem de ler este meu texto.

A tal peça da CNN está aqui e peço-vos para abrirem e lerem primeiro, mas podem também acreditar em mim e continuarem aqui que eu vou dar os pontos principais, e em português.
O tal título mais completo, o que aparece por baixo desta imagem que também reutilizei, uma versão a preto e branco de um suposto quadro espanhol retratando a chegada de Colombo às Américas em 1492, reza assim: Colonos europeus mataram tantos nativo-americanos que mudaram o clima global, dizem investigadores.
E expande pelos primeiros parágrafos:
Quando os Europeus chegaram às Américas causaram tanta morte e doença que alterou o clima global, de acordo com um novo estudo.
Colonos Europeus mataram 56 milhões de povo indígena durante certa de 100 anos na América do Sul, Central e Norte, causando grandes porções de terreno agrícola ficarem ao abandono e serem alvo de reflorestação, investigadores na University College London, ou UCL, estimam. O aumento em árvores e vegetação ao longo duma área do tamanho da França resultou numa descida maciça do dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, de acordo com o estudo. Os níveis de carbono mudaram o suficiente para arrefecer a Terra em 1610, descobriram os investigadores. Colombo chegou em 1492.

Aqui já estava eu a torcer o olho devido à utilização da palavra "mataram" 2 vezes, mas o pior estava para vir na conclusão do artigo:
As implicações do estudo vão para além da ciência do clima e contribuem também para investigação em geografia e história, disse Maslin (NA: um dos autores do estudo), notando que as mortes dos indígenas americanos contribuíram directamente para o sucesso da economia europeia. Recursos naturais e comida enviados para o Novo Mundo ajudou a população da Europa a expandir-se. Também permitiu às pessoas pararem a agricultura de subsistência e começarem a trabalhar em outras indústrias para terem dinheiro extra. "A coisa realmente estranha é que, o despovoamento das Américas pode ter inadvertidamente permitido aos Europeus dominarem o mundo", disse Maslin. "Também permitiu a Revolução Industrial e para que os Europeus continuassem esse domínio".

É realmente uma coisa estranha, concordo com o co-autor! Mas antes disso pergunto: com que ideia é se fica ao terminar de ler este artigo? Que os Europeus chegaram às Américas, chacinaram os nativos às dezenas de milhões e só por causa disso é que a Europa se manteve o continente dominante até ao século XX, é isso? É certamente o que muita gente pensa pois encontrei diversas notícias com essa mensagem, espalhadas pela net, todas baseadas nesta da CNN.
E eu à primeira vez que me deparei com isto, numa partilha no Facebook, respondi logo o seguinte:
A imagem e o título são um bocado clickbait para dar a ideia de extermínio maléfico (até pela imagem escolhida) qd 90% da população indígena foi morta por epidemias levada pelos Europeus; o primeiro parágrafo fala da doença mas está escrito "caused so much death and decease" que da ideia que mataram directamente e propositadamente tantos qt a doença e isso não é verdade.Repara que já o mesmo não aconteceu em África devido à proximidade e contacto mais directo entre os povos (ou seja os Africanos já "conheciam" muitas das doenças dos Europeus) e isto apesar dos Europeus colonizarem e escravizarem a maioria dos povos de lá...Tbm é um bocado parvo da parte do autor sugerir que é por haver menos gente nas Américas que a Europa manteve o seu domínio uma vez que a Europa chegou a outras regiões do Mundo igualmente muito povoadas e dominou na mesma. Se a Europa dominou África e grande parte da Ásia (que tecnologicamente estava muito à frente das Américas) como é que os povos Americanos mesmo com muita mais gente iriam resistir? A descoberta das Américas traria as mesmas vantagens à Europa que trouxe com ou menos índios vivos.Sabes o que mudava mesmo? Se não tivessem morrido de doença não teriam levado tantos africanos para lá pq os Europeus usariam mão de obra local.Teria de ler o estudo completo e não me apetece mas julgo que as conclusões mencionadas na CNN são feitas à medida...

Mas acabei por ir consultar o estudo (não lê-lo completamente), e também podem consultar através deste link, e em lado nenhum refere matança. os 90% são valor total da redução da população mas o artigo fala sempre nas doenças levadas pelos Europeus que os Americanos não conheciam. O próprio estudo até menciona que na maioria dos locais a doença chegava ainda antes dos europeus (e isso era um problema para termos registo da população na altura pois quando a malta dos livros e registos chegavam a novas povoações ou tribos, já muitos tinham morrido).
Nesse aspecto, da ideia da matança e extermínio que está implícito na notícia a culpa é exclusiva da CNN.
É verdade que os europeus levaram a morte, mas a matança não foi intencional, e duvido que para além de matar para dominar e controlar a população houvesse alguma vez o objectivo de exterminar os locais, pois isso não foi o que aconteceu noutros locais. Pela simples razão que pessoas são um dos recursos que o novo poder colonial poderia explorar!

Mas supostamente um dos co-autores terá dito aquela implicação de que foi graças a esse "extermínio" que a Europa se manteve onde estava, o que para mim é uma palermice tal como escrevi. A ser verdade que o co-autor o disse à CNN acho que é uma parvoíce pegada. E nada no estudo menciona Revolução Industrial ou economia.
Mantenho o que afirmei no comentário que citei atrás, mas acrescento mais dados à parte da re-população das Américas por escravos oriundos de África. O estudo afirma claramente que a área mais povoada das Américas é onde se situa actualmente o México. E o México continua a ter uma grande parte de sangue nativo na sua população. De qualquer modo havendo muita população perto, as potências europeias certamente não levariam tantos escravos para as Caraíbas e América do Norte, usando para isso mão-de-obra local, mudando-a apenas de sítio mas muito certamente escravizando-a também. Na América do Norte os diferentes povos índios (como as First Nations) seriam muito mais fortes e as guerras entre o homem branco e o (denominado) pele-vermelha teriam sido um bocado diferentes. Mas o resultado final seria similar apenas com uma distribuição de etnias bem diferente nos dias de hoje sobretudo na América do Norte e Caraíbas.

Agora gostaria de ter opiniões de leitores (amigos) que são do ramo da História e tenho vários seguidores (pelo menos nas redes sociais) que o são e podem dar o seu comentário a esta peça da CNN. Ao estudo nem precisam pois ele não tem nada de errado no meu entender, mas a apresentação do mesmo pela CNN, e subsequentemente outros media, é grosseira e errónea, caindo quase na categoria de fake news...

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