domingo, maio 26, 2019

As coisas como elas são


Dizem-nos os filmes, as séries, a Internet e até muitos conhecidos, que num casal existe sempre alguém que tem de esperar que o outro se arranje. Aqui em casa também mas ao contrário de toda a gente, aqui em casa quem espera mais é a Carolina. Isto porque ela é muito mais rápida que eu a arranjar-se na casa de banho e no vestir. Não sei se já o escrevi antes mas ela tem alturas que demora menos tempo a fazer um cocó do que eu demoro a fazer um chichi.
Aqui há uns dias decidi cronometrar-me a tomar banho, pois é normalmente nesse particular que ela costuma se queixar que eu demoro muito. Em menos de 9 minutos já estava cá fora, com a cabeça e os pés secos. Não saí logo da casa de banho pois eu seco-me, penteio-me, lavo os dentes e os óculos e ponho desodorizante e perfume antes de sair. Quando foi a vez da Carolina também cronometrei, e ela também demorou quase 9 minutos mas foi tudo incluindo ter feito um cocó antes de se lavar (mas não lavou a cabeça).
Não há nada a fazer, as coisas são como são e ela será sempre mais rápida que eu nestas coisas.

Agora que trabalho no centro, mesmo no centro da cidade, tenho ao menos a vantagem de ter boas vistas. Estou sentado à janela com vista para o Herengracht e por isso durante o dia vejo passar barcos de turistas e não só. De vez em quando aceno aos turistas e já me acenaram de volta. Também oiço o trote de cavalos que puxam as charretes, que passam na rua se bem que é mais difícil de os ver. E depois vê-se muita gente a passar. E a fazer coisas estranhas também. No outro dia olho pela janela e vejo uma rapariga a vestir umas calças do outro lado do canal! Não sei o que tinha por baixo antes mas deu para reparar que ela estava a mudar de roupa, mas no passeio, em plena rua! Imagino que tenha vindo com roupa confortável para o centro, provavelmente de bicicleta, e estava agora a mudar para uma indumentária mais fashion...
Também cruzo quase sempre a Dam. De manhã está vazia, e no início foi surpreendentemente para mim pois nunca tinha estado na Dam com ela vazia. Ao final da tarde a regressar a casa está sempre cheia de turistas, as ditas charretes à espera de turistas, artistas de rua e os habituais protestantes ou activistas políticos a reivindicar uma causa qualquer. Numa das vezes era um gajo com uma faixa grande a dizer "Lula Livre". Chamou-me mais a atenção porque pronto, enfim, acho que há coisas que merecem mais o tempo e dedicação de uma pessoa...

Os turistas todos ao final da tarde são uma componente que contribui para eu demorar sempre mais tempo a regressar a casa do que a vir para o trabalho de manhã. A média tem sido 50 minutos a ir para o trabalho e 65 minutos a regressar a casa.Os turistas obrigam a mais ziguezague enquanto me dirijo para a paragem do metro e tornam o cruzar de estradas mais demorado também. E por alguma razão, mas isso não será culpa directa dos turistas, quando chego à estação de Zuid o comboio que vem para Hoofddorp está quase sempre a sair na altura que subo para a plataforma, ou seja chego quase sempre atrasado meio minuto. Depois tenho de esperar outro, a maioria das vezes apanho o próximo porque param sempre em Schiphol (o aeroporto) e depois mudo para outro ou apanho lá o autocarro, mas vão logo mais uns minutos.

Essa é uma das razões para eu não gostar de usar transportes públicos para ir e vir do trabalho, apesar de eu gostar imenso de andar de transportes públicos. É verdade, gosto mesmo, e nestas poucas semanas tenho experimentado de tudo. Ás vezes só num dia é bicicleta, comboio, metro, caminhar, tram, comboio e autocarro. Já foi um dia que foi assim, e com passagem pelo aeroporto, aliás é sempre, é a estação onde param todos os transportes que vêm nesta direcção.
Mas o meu gosto principal de andar nos transportes é o poder observar pessoas. Eu adoro estar sentado ou em pé e olhar em meu redor. Nos dias de hoje se calhar passo por um maluquinho qualquer, por nao estar de cabeça inclinada, a olhar para um dispositivo electrónico, ou em poucos casos agora, para um livro. Por isso mesmo é que também leio de vez em quando. Sobretudo quando o primeiro comboio que apanho é o que vai para Amsterdam Centraal e tenho lugar sentado, leio porque aí fico quase meia-hora no mesmo lugar, dá para aproveitar.


E o que tenho lido, quase a acabar já, é Saramago. Salvo erro este é o primeiro livro que leio do homem, e estou a ler O Evangelho Segundo Jesus Cristo. Bastar ler uns capítulos para se perceber porque o Saramago ganhou um Nobel. E é verdade que ele não gosta de pontos finais, pelo menos nesta obra. Mas faz todo o sentido esta técnica. Os diálogos sucedem-se nas mesmas frases, apenas separados de vírgulas, e mesmo sendo frases de personagens diferentes está tudo ali de enfiada. Mas isso torna o diálogo no livro muito mais natural, mais fluído, como que imitando uma conversa a sério em que as pessoas na grande maioria das vezes não fazem pausas entre frases, perguntas e respostas; um começa a falar quando o outro ainda está a terminar. E é isso que se nota ao ler. Apesar de exigir algum esforço porque de vez em quando ficamos na dúvida quem é que a personagem que está a "falar" mas isso também é bom porque imergimos-nos mais na história. Não se pode ler o livro, e apesar de ser o primeiro arrisco-me a dizer, não se pode ler Saramago, levianamente.
E o domínio que o homem tinha do Português! Encontro cada palavra que na maioria dos casos só fico a imaginar o significado devido ao contexto... Apre que o homem era mesmo um Senhor Escritor e basta-me ler este livro, que o meu irmão escolheu exemplarmente para mim, para afirmar isto.

Por um lado sinto pena que não continue a ir de transportes públicos por muito mais tempo, pelo menos diariamente. Vou perder estes prazeres, observar pessoas, ler livros, e até o prazer de viajar em transportes públicos e gostar de avaliar os diferentes equipamentos (diferentes composições de comboio, de metro, autocarros) e as paisagens, mesmo que seja repetitiva vai-se sempre descrobrindo coisas novas, nem que sejam apenas pormenores.
Também me permite fazer exercício, pois estou a fazer 8 km por dia de bicicleta, fora o caminhar, e isso já se nota no corpo mesmo que não se note tanto na balança como cheguei a pensar há uns dias, até me ter apercebido que estava a pesar-me em cima de um tapete e isso estava a afectar a balança. Mas eu sinto no corpo, na roupa, no cinto das calças.
Então porque não continuo eu a ir de transportes públicos? Por 2 razões: tempo e dinheiro. E como tempo é dinheiro...
Mesmo tendo um passe dos comboios, em 18 dias de trabalho já gastei quase €230. E tenho sempre chegado mais tarde a casa do que o planeado. Aqueles minutos que se passam à esperado autocarro/comboio/metro/tram podem ser frustrantes ao fim de algum tempo. E depois quando alguma coisa corre mal, então... Noutro dia cheguei a Zuid e o metro estava parado. Só estava a andar umas estações mais à frente. Estava a vir outro que parava a seguir noutra estação de comboio então entrei logo nesse mas que não foi a melhor opção (foi a opção do momento) e o resultado foi ter demorado 40 minutos a chegar ao escritório quando deveria só ter demorado mais 10...

O maior problema mesmo é que o final do dia e chegar a casa depois dos miúdos terem jantado e estar pouco tempo com eles. Eu sei que para muitas famílias isso é normal, mas eu admito que estou-me a cagar o ser assim para outros. Estávamos habituados a ser eu a leva-los e a ir buscar a maioria das vezes. Mesmo quando não ia buscar estava em casa para jantar, ou quase sempre (havia um ou outro dia que chegava mais tarde). Obviamente quando nos habituamos a uma rotina e ela depois muda para pior (menos tempo com a família) uma pessoa sente-se triste. Mas ha solução e irei conseguir certamente ganhar 1 hora por dia. Não só por demorar menos tempo na viagem mas também por ao chegar mais cedo de manhã posso sair mais cedo, logo ganhando essa hora onde realmente interessa, o final do dia. E para além de tempo, vou também poupar dinheiro.

Já há bastante tempo que não falo de parentalidade. Gosto de escrever sobre isso, minhas estórias, experiências e opiniões, mas tivemos uma fase em que não estavam as coisas a correr bem e não era capaz de falar ou escrever sobre isso. Só posso dizer que senti-me incapaz e um falhanço como pai algumas vezes. Acho que recuperei dessa fase mas tenho de manter presente na minha mente o pensamento, do que fiz de errado e sobretudo que tenho sempre de ambicionar ser melhor.
Mas noutro dia tive uma experiência curiosa, que não sei se fiz bem ou mal, só sei que o resultado final não foi mau, mas caricato.
A Amélia volta e meia dorme mal, acordando a chamar diversas vezes durante a noite. Ela tem um dom especial para o fazer quando eu estou a ir para a cama, por exemplo, a arrastar-me cheio de sono, muitas vezes imediatamente após eu deitar a cabeça na almofada com a ideia "vou agora dormir um belo sono"... Numa destas noites, ela estava a chamar pouco depois de me ter deitado. Fui ao quarto e ela diz-me que quer vir para baixo (para a sala). Eu disse-lhe que estava cheio de sono e queria dormir, que se ela quisesse vir que viesse mas vinha sozinha. Ela saiu da cama e desceu as escadas e eu fui-me deitar na minha cama. De manhã quando desci ela estava assim:


E pronto, é isto; que andava para publicar isto há 2 semanas, a altura em que editei a foto do topo e fiz o rascunho da crónica. Mas com o novo trabalho, o tempo gasto nas viagens e outros afazeres, estava difícil. Alguma coisa terá ficado por dizer, apesar do texto já ir longo. Mas pronto, são as coisas como elas são...

PS - Se por acaso estão-se a perguntar o porquê da fotografia do presunto, sim é presunto, ali a meio do texto, fiquem a saber que não tem razão específica a não ser estar ali do nada, para vos confundir. E sim é uma foto minha, a cortar o naco de presunto que compramos porque o presunto assim cortado por nós até tem outro gosto.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Opina à tua vontade