quinta-feira, maio 26, 2016

Carros aqui - afinal há muitos ou há poucos?


Isto não é um assunto novo. Há 3 anos atrás escrevi sobre isto usando as vendas de carros novos e falando brevemente da minha própria experiência (o que vejo todos os dias e quando ando de um lado para o outro). Mas a ideia que na Holanda a maioria das pessoas não tem nem usa carro, persiste.
Na mesma dissertação de há 3 anos apareceu um gajo a dizer que o meu ponto de vista estava errado por causa daquilo que ele via em Amesterdão (quando eu tinha feito a ressalva que no centro de Amesterdão é diferente, apesar de na mesma se verem carros por toda a parte).

Nesta segunda-feira veio uma notícia sobre o novo recorde em 2016 de filas de trânsito que houveram nessa manhã, pois tinha chovido a noite toda e estes gajos daqui ficam sempre à nora quando o tempo é pior que o esperado.
Mas afinal se ter carro aqui não compensa por causa dos impostos e preços e porque a política da mobilidade é muito boa, como é possível haverem 757 km de fila numa manhã de segunda-feira e num país que até é pequeno?

Antes de mais os factos. Há 3 anos eu falei apenas da venda de carros novos e mostrei que per capita vendia-se mais carros novos do que em outros países onde se pensa que toda a gente anda de carro.
Mas lembrei-me que na estrada circulam todos os carros, velhos ou novos. Por isso a melhor maneira de comparar é pelo tamanho do parque automóvel para ligeiros de passageiros (os carros das pessoas), ou seja o número total de carros registados no país (e a maioria circula mesmo que não todos os dias).
Curiosamente só consegui encontrar estatísticas completas para o ano de 2013. E mesmo assim tive de usar fontes diferentes (o que não é bom pois alguns valores variam segundo a fonte).
A maioria dos valores foram retirados do Eurostat, mas para aqueles que não tinham valores para 2013 usei o CBS (o gabinete oficial de estatística daqui), o WorldBank e o site Statista.

A Holanda tinha um total de 7,915,613 ligeiros de passageiros registados para 16,804,432 habitantes. Isso significa que existia um carro em circulação por cada 2,12 habitantes.
Não me parece de todo um número baixo. É verdade que as estatísticas dizem que existem mais bicicletas na Holanda que habitantes (e carros é pouco menos de metade) mas o facto de eles terem muitas e andarem muito de bicicleta não invalida que tenham e andem também muito de carro.
É o mesmo que eu beber muita água não invalida que eu na mesma beba muita cerveja.

Mas os números só fazem sentido quando comparados com outros países. Assim temos:
Na Alemanha, o maior mercado da Europa, existia um carro por cada 1,87 habitantes (~43,851,000 carros registados para 82,132,753 habitantes);
Na França existia um carro por cada 2,04 habitantes (~32,244,000 carros registados para 65,925,498 habitantes);
Na Espanha existia um carro por cada 2,12 habitantes (~22,025,000 carros registados para 46,620,045 habitantes);
E finalmente Portugal, existia um carro por cada 2,40 habitantes (~4,327,000 carros registados para 10,457,295 habitantes).

Os números não mentem; na Holanda, em proporção, existem definitivamente menos carros que Alemanha e França, as 2 maiores economias da Zona Euro, mas precisamente o mesmo número de carros que em Espanha e mais do que em Portugal, países onde certamente ninguém pensa que muita gente anda de bicicleta ou mesmo de transportes públicos.
É por essa razão que existem todos os dias muitas filas de trânsito aqui.
É por essa razão que eu ontem fui ao jantar de equipa com bowling antes e demorei quase 50 minutos a ir porque era hora de ponta, mas apenas 16 minutos a vir (e circulando abaixo dos limites de velocidade da estrada).

Eu sei que vão continuar a haver pessoas que não concordam com o que digo. Que vão continuar a achar que aqui, porque existem muitas bicicletas, as pessoas não compram muitos carros também porque estacionamento, impostos e combustíveis são caros.
E porque em Amesterdão não se vêm assim muitos carros e pensa-se que não compensa ter!
É o Erro do Observador-Observado, que dá azo a números e conclusões baseados apenas no que as pessoas observam no seu momento e espaço de observador (e ignorando todos os outros momentos e espaços em que eles não observam).

Como disse muitas vezes mas não fui claro há 3 anos atrás, para quem anda maioritariamente pelo centro de Amesterdão e só sai de transportes públicos, não observa a quantidade de carros que circulam entre cidades por estas auto-estradas e estradas fora.
Já eu, que da minha cadeira no trabalho consigo ver sem ter de me levantar 3 auto-estradas (A10, A4 e A9) e ando de carro para muitos sítios por este país fora, observo muito congestionamento nas horas de ponta e o tráfego continuo que, até fora dessas horas, é constante. Só não é tão grave como na região da Grande Lisboa porque eles aqui espalham-se mais.
Mas mesmo assim o suficiente para que todas as segundas-feiras de manhã existam em média mais de 200 km de filas de trânsito pelo país fora ou quando o tempo está ruim, 757 km de filas.
E isto num país que tem 400 km entre uma ponta (extremo sudoeste) e outra (extremo nordeste).

1 comentário:

  1. A maioria deles tem carro até porque viajam muito de carro para outros sítios com o seu atrelado atrás para acampar...
    Fora isso sim, o trânsito aqui muitas vezes é pior que em Portugal sem dúvida, agora que temos carro e nos movimentamos mais para fora da cidade (que na cidade continuamos a preferir a bike) vemos em primeira mão que, de facto, há sim muitos carros.
    Fui ver aqui https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/rankorder/2246rank.html#nl são o vigésimo segundo país que mais consome protdutos refinados de petróleo, ajuda a confirmar a teoria de que há carros e os usam...

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