segunda-feira, fevereiro 29, 2016

Cartazes, mamas e batatas cozidas


Hoje é dia 29 de Fevereiro, um dia especial pois só daqui a 4 anos teremos outro e ainda por cima o di Caprio lá ganhou o Oscar para Melhor Actor. Por isso eu deveria escrever alguma coisa hoje para marcar o dia.

Lembrei-me que há uns anos atrás, antes de toda a gente estar nas redes sociais e antes de toda a gente ter Internet a toda a hora e todo o lado, as coisas eram um pouco mais simples e menos polémicas.
Quando víamos algo estúpido comentávamos em casa ou com amigos no café e a coisa ficava por aí.
Antigamente uma coisa como o cartaz do Jesus e os 2 pais do Bloco de Esquerda traria umas reacções pessoais de "olha que parvoíce" ou "olha está engraçado" ou até mesmo "pois é, têm toda a razão" e prontos ficava por aí.
Mas agora as pessoas têm necessidade de partilhar a sua indignação. Outros partilham e comentam e de repente está toda a gente a falar disso. E é verdade que os órgãos de comunicação social também dão destaque a coisa, com a notícia da mesma e depois crónicas ou artigos de opinião. Mas eu acho que eles dão tanto destaque porque o tema está em destaque nas redes sociais e se o público quer falar disso, os media têm de responder a essa necessidade do mercado.

Mas o cartaz do BE não é caso único. Aqui na Holanda uma loja de roupa masculina, a Suits Supply, espalhou estes posters por todo o lado:


Eu quando vi isto numa paragem de autocarro só pensei que era um bocado estúpido, mas não me admirei muito pois esta marca tem cartazes e outdoors um bocado esquisitos. Como na imagem os gajos escorregam pelas mamas da gaja isto atraiu a raiva da Internet tendo até pessoas organizado um evento para irem pintar com spray estes cartazes.
Eu percebo que as pessoas se possam sentir ofendidas, mas mais uma vez porque é não pensamos apenas que é parvo e estúpido? E se estamos mesmo contra porque não pedir um boicote à loja na vez de apelar a actos de vandalismo?

Quando conversava com a Carolina sobre este cartaz, apenas a dizer que era estúpido mas que já andavam campanhas online sobre isto, ela falou doutra coisa relacionada: que as pessoas pelos vistos agora também ficam indignadas quando uma mãe amamenta em público (a relação com o cartaz é por se poder mostrar mamas em publicidade ou quando se quer vender sexo, mas mostrar parte duma mama para amamentar já é nojento).
É outra coisa que me deixa parvo. Tendo crescido em Portugal nos anos 80 e 90 não estou propriamente habituado a ver mulheres a amamentar em público. Isso não era habitual mas a única coisa que me vinha à ideia quando isso acontecia era apenas "olha esta mulher não tem problemas em amamentar" logo seguida de "será que parece mal eu ficar a olhar a ver se lhe vejo a mama?".
Nunca me passou pela cabeça ser nojento ou ser desconfortável para mim. Quer dizer a única cosia desconfortável é ser apanhado a olhar para as mamas dela, mas isso é igual a uma mulher que amamenta como uma mulher com decote que passe por mim na rua. Mas agora fala-se na Internet, nas redes sociais claro, que meio mundo acha nojento e contam-me mesmo casos em que as pessoas insultam as mulheres que o fazem!

É mesmo uma parvoíce esta nossa maneira de reagir. E isto é causado pelas redes sociais, tenho poucas dúvidas. Antes podíamos pensar um monte de coisas mas ficava tudo dentro ou era comentado no nosso círculo de amigos. E nem sequer tínhamos coragem de ir reagir publicamente.
Mas agora não. Como facilmente se pode reagir na Internet, e as pessoas fazem-no cada vez mais, também já se começa a levar o espírito para a vida real, fora da Internet.
E o pior de tudo é que as pessoas sentem uma necessidade enorme de criticar tudo e qualquer coisa, mesmo aquelas das quais nada percebemos.
Mas à boa maneira humana, continuamos sem reagir correctamente nos temas e assuntos importantes e que nos afectam mesmo. Sem falar da política sequer usando apenas um exemplo mais mundano, não dissemos nada quando nos cobram serviços a mais ou somos enganados por empresas de serviço mas depois precisamos arrasar o Bloco de Esquerda, vandalizar posters de publicidade ou insultar um mãe que amamenta, sabe-se lá porquê....

Eu sou grande fã e abraço as novas tecnologias e aqui estou a escrever nas redes sociais, mas gostava que em parte as coisas ainda fossem mais simples como dantes, quando apenas encolhíamos os ombros ou dávamos uma risada ao ver uma coisa estúpida, mas tal como as batatas cozidas que não gostávamos, deixávamos na borda do prato e continuávamos a comer a carne...

PS - Há cerca de um ano também devo ter partilhado a hashtag #JeSuisCharlie. Acredito fortemente na liberdade de expressão e por isso acho que toda a gente, pessoas e entidades, são livres de dizer o que pensam. Existem obviamente limites daí as pessoas poderem ser julgadas até pela Justiça pelo que dizem e acredito também que quem apela a crimes, ao ódio e ao fim da liberdade não deve poder se refugiar na liberdade de expressão. Mas na mesma qualquer pessoa tem direito a ser estúpido. O BE, a Suits Supply, etc todos têm direito a dizer coisas parvas. É certo que o limite entra a liberdade deles e a nossa liberdade é difícil de ajuizar porque isso muda entre pessoas. Mas limitar logo o que se pode dizer apenas porque pode ofender é um caminho muito perigoso e prefiro que se lide com consequências do que se diga do que não dizer nada por medo delas. Infelizmente parece estarmos numa altura, como escrevi em cima em que há sempre consequências porque as pessoas não conseguem ignorar ou desconsiderar aquilo que não gostam.

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